terça-feira, 26 de junho de 2007

Dois Arquétipos da Narrativa Cinematográfica

por Marcelo Matos
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A grosso modo dá para identificar dois modos estruturantes, arquetípicos, da narrativa cinematográfica. O primeiro é a aventura do herói, e temos a Odisséia de Homero como um bom exemplo. Neste tipo de arquétipo, o personagem principal é tomado por um motivo que o faz entrar numa aventura, onde encontra outros personagens que irá compor a história. Assim temos, "A Aventura" de M. Antonioni, "Deus e o Diabo na Terra do Sol" de Glauber, "Cinemas, Aspirinas e Urubus" de Marcelo Gomes e por ai vai.
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O segundo arquétipo da narrativa cinematográfica é aquele onde prepondera um acontecimento ao qual o personagem principal deve se adaptar, ou não. Neste tipo de história, todo o "feeling" do filme gira em torno de um acontecimento. Dentre estes temos: "Teorema" de P. P. Pasolini, a chegada do jovem na família faz todos os membros desta passar uma revisão de suas sexualidades; "O Ano em que Meus Pais Sairam de Férias" de Cao Hamburguer onde um menino é deixado só dentro de um edifício devendo todos, e até ele mesmo, lidar com esta situação...
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Algumas narrativas misturam estes dois arquétipos. "Oshama" - daquele diretor afegão - parece ser um meio termo no qual uma menina tem que virar menino para poder dar o que comer a sua família. Este acontecimento se transforma numa situação no decorrer de toda a história que os personagens vão ter que resolver. Ao mesmo tempo, é este acontecimento que faz a menina traçar uma linha de fuga onde ela se envolve com as mais terríveis crueldades do Talibã. E aqui, "Os Caçadores de Saci" de Sofia Federico no qual a chegada dos sacis requer de uma família interiorana traçar uma aventura para expulsá-los da casa, mas que na procura de sua solução - principalmente com a chegada do caçador, acabam por engendrar uma aventura dentro da própria fazenda. "A Cidade Cargueiro" também é um meio termo entre estas duas estruturas: os signos da cidade (modernidade) devem ser incorporados pela imaginação dos meninos (tradição). Mas esta incorporação só se dá nas peripécias, como Aline gosta de dizer, dos meninos pela ilha. Pelo menos no roteiro, as duas estruturas (a assimilação do acontecimento-cidade e a aventura-de-chegar-até-ela) são indiscerníveis.

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