segunda-feira, 21 de abril de 2008

Depois de um tempinho, revisitando Dubois, em uma aula simpática e irônica de classificações:

O cinema “primitivo”:

“É o cinema das origens, anterior a 1915 e ao Griffith... cinema das descobertas e das experiências, da inocência, das primeiras sensações fortes, da profundidade e do plano-sequência “brutos”, das trucagens selvagens e ingênuas. É um cinema em bloco: o filme é a filmagem, completa, sem perda. É como uma fotografia no tempo.


O cinema “clássico”

Durante cerca de trinta anos (sua era de ouro é 1915 -1945, em Hoolywood) de D.W. Griffith a Alfred Hitchcock, de Serguei Eisenstein a Fritz Lang, de Ernst Lubitsch a John Ford, de Howard Hawks a Jean Renoir, é o cinema que fratura a “cena” primitiva e quebra o bloco, produz a decupagem, a escala de planos, a lógica labiríntica dos cortes, as leis (?) da montagem; articula o cinema como linguagem e constrói seus grandes parâmetros (espaço, tempo, ator, cenário, narrativa e som); coloca o espectador na posição não mais de voyeur amedrontado, mas de arquiteto do sentido e dos efeitos. Em termos dramáticos e cenográficos, o cinema “clássico” é aquele do espaço em off, do prolongamento imaginário da ficção, do suplemento de sentido: cinema da verdade oculta nos bastidores, do “segredo atrás da porta”.

Fritz Lang. Secret beyond the Door, 1948

(...) E toda a arte desse cinema será a de jogar com nossa expectativa em relação a este suplemento, com nossa inteligência de espectador e nosso desejo de ver, de saber e de saber mais. É um cinema da mais-valia, que visa fazer fruir a busca, incessantemente desencadeada e adiada, daquilo que há atrás, através, a mais. A narrativa é agenciada com este único objetivo; os atores ( seus gestos e olhares), os diálogos, os objetos e o cenário (portas, janelas, espelhos e ruas) estão lá para balizar o trajeto do espectador na busca do “segredo”.

O cinema “moderno”

É aquele que tomando os clássicos como pais, irá com força e violência variáveis, afastar-se do classicismo instituído, e recusar aquilo que, neste, se instala no artifício e na “boa qualidade”, que se esclerosa na rotina da máquina bem azeitada, de eficácia previsível e excessivamente controlada. É um cinema da ruptura, mas de uma ruptura em relação a um jogo funcionalista excessivamente articulado. O cinema “moderno” é aquele do pós-guerra. (que vem depois da ruína, desastre, da falência mundial, da mise-em-scène-propaganda)

...

O cinema moderno é, em todas as acepções do termo, um cinema do plano. Ali onde a dramaturgia clássica trabalhava a crença de um “segredo atrás da porta”, a cenografia moderna prefere suprimir todo mergulho na profundidade; nela, o espaço, se fecha sobre si mesmo: não há nada a ver atrás, nenhum suplemento no espaço off; nem cena nem bastidor; apenas uma superfície luminosa( como um quadro-negro ou uma folha branca); o diretor dá lugar ao “autor”, a mise-em-scène da lugar à “escrita” plana. É um cinema da frontalidade: tudo está lá, na imagem, na superfície, em um só e mesmo plano. O espectador está de frente, seu olhar bate na tela e ricocheteia.

François Truffaut. Noite Americana, 1973


Cinema do plano, também, enquanto habitado pela idéia da filmagem, do traço a reter daquilo que ela comporta de mágico (ou de terrível): estas fagulhas de real que vêm respingar na película, dar-lhe sua cota de verdade, de modo que cada plano, para os modernos, seja uma aventura. Algo do cinema primitivo impregna assim o cinema moderno: um certo gosto pela experiência, um certo sentido de inocência – ambos atravessados, em todo caso, por um saber (e um desejo) do cinema “clássico” : a cinefilia, a citação, o fetichismo dos “pais”.

O cinema dos anos 80 ou cinema “ maneirista” ou um cinema do “depois”

...feito por quem tem a perfeita consciência de ter chegado tarde demais, num momento em que certa perfeição já fora atingida em seu domínio. (...)Como filmar hoje, depois de tudo, uma cena de amor, um diálogo, um assassinato, um beijo? Todo o peso da tradição anterior e de sua excelência está lá, e ele pesa e chega a bloquear o trabalho do cineasta. E é preciso encontrar a maneira, a maneira de se libertar deste peso, de re-fazer, de filmar de novo o encontro de um homem e uma mulher. (...) Daí também as “maneiras” freqüentemente sinuosas, as contorções, as anamorfoses, as sofisticações que o cineasta se impõe, e que autorizam a falar, a este respeito, de cinema do artifício, do factício, do excesso, da panóplia, do cenário ostensivamente teatral.

Jean- Luc Godarg. Passion, 1982


Um cinema da imagem “folheada”

Por outro lado, cenograficamente, o cinema maneirista coloca ainda, de outra forma, a questão do espaço: não se trata mais de saber o que se passa atrás, na profundidade de campo, nem o que se mostra por cima, na superfície da imagem. A questão é, antes, a de qual imagem ver sob a imagem, dada a natureza desta estética das imagens “em camadas”, deslizando umas sobre as outras, como num folheado: sob a imagem, já uma imagem. ( ...) O cinema é seu próprio pano de fundo.

Dubois, P. - Cinema, vídeo e Godard, pg. 145 - 150

Nota de rodapé:

as considerações de Dubois tem uma pretensão explicita: reverenciar as "inovações" trazidas pelo formato analógico à produção audiovisual ( viva o vídeo!). Ou seja, em tempos de histórias repetidas o que vale é a forma de re-contá-las. Argumento muito válido, especialmente se pensarmos na "função criativa" dos formatos digitais hoje em dia...

Postado por Aline Frey



segunda-feira, 7 de abril de 2008

O DEVIR-CINEMA DA FOTOGRAFIA

Arlindo Machado, em “Pré-Cinema e Pós-Cinema”, mapeou um devir-cinema da fotografia. Foram experiências em que a fotografia intentou o movimento.

Em 1912, o fotográfo Jacques-Henri Lartigue com uma câmera com um obturador de plano focal iria criar um representação do velocidade, muito utilizada até os dias de hoje pelos desenhistas.


Também em 1912, Étienne-Jules Marey imprime fases distintas do movimento na mesma película tirando com isso uma espécie de gráfico do movimento.

Atualmente, o francês Fréderic Fontenoy produziu as "créatures", que são espécies de corpo-sem-órgãos: uma dupla-captura entre o movimento corporal e a câmera fotográfica com obturador de plano focal e exposição baixa.

O húngaro Andrew Davidhazy realizou experimentos com fotografias de 360º , uma espécie de câmera que permite fotografar por um determinado intervalo de tempo obtendo assim objetos achatados.